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  • Paula Guimarães

Mais Felicidade, Menos Smartphone? (2 de 2)


Jovens encostados no muro, cada um checando seu próprio celular

No mês passado, falamos sobre a Geração Smartphone, e analisamos, entre outras características, o grau e o motivo da utilização de smartphone por pessoas de diferentes gerações (confira aqui). No entanto, aquele estudo não avaliava o impacto desses hábitos na vida das pessoas, nem a diferença entre grupos de mesma idade ao longo do tempo. Agora, nesta Parte 2, poderemos aprofundar estas análises.


Uso de aparelhos eletrônicos e felicidade dos jovens através das décadas


Em janeiro deste ano, pesquisadores das universidades San Diego State University e University of Georgia publicaram um estudo na Revista Emotion para tentar definir qual hábito dos adolescentes está relacionado a seus índices de felicidade. O estudo procurou desvendar se há correlação entre felicidade e tempo gasto em atividades com tela (mensagens de texto, mídias sociais, uso de smartphone, internet, tv, jogos virtuais, conversas por vídeo, etc.) e sem tela (como esporte, relação interpessoal, encontro religioso, uso de mídia impressa e lição de casa).


Eles partiram da hipótese de que quanto mais tempo se passa nas mídias sociais, mais infeliz é o jovem, a qual já foi confirmada por outros estudos. Eles também se valeram de estudos como este que, de outra maneira, evidenciaram que participar das mídias sociais é importante para a construção positiva da auto-estima dos adolescentes. Estes achados, embora pareçam contraditórios, demonstram que existe algum ponto de equilíbrio entre o uso positivo da tecnologia e o uso excessivo que gera infelicidade.

Jovens de diferentes etnias checando diferentes aparelhos eletrônicos: tablet, celular, notebook. Fundo da imagem com desenhos relacionados à juventude: ipod, bicicleta, videogame, entre outros.

Para relacionar os hábitos eletrônicos dos jovens aos índices de felicidade entre gerações, esses pesquisadores analisaram dados da pesquisa nacional anual “Monitoring the Future” (“Monitorando o Futuro”, em tradução livre) da Universidade de Michigan, que investiga os hábitos de adolescentes de 13 a 18 anos (conforme o ano escolar dos EUA – que no Brasil corresponderiam ao 8º ano do Ensino Fundamental, 1º e 3º anos do Ensino Médio). Essa pesquisa acontece desde 1975* e possui dados relacionados aos hábitos de lazer, relações sociais e sentimentos de felicidade de mais de 1,1 milhões de adolescentes dos EUA.


Os estudantes analisados responderam perguntas sobre o tempo que gastavam em telefones, tablets e computadores, bem como questões acerca de suas relações sociais e sentimento de felicidade.


Analisando as tendências históricas para grupos de mesma idade, percebe-se um crescimento constante nos índices de felicidade, satisfação e autoestima dos adolescentes de 1991 até 2012, quando houve uma queda brusca nestes valores até 2016. Abaixo, temos os indicadores “tendência a se sentir sozinho” e “tendência a se sentir excluído”, que estão inversamente relacionados aos índices de felicidade. Como podemos ver, estes índices estavam em queda constante até o início dos anos 2000, demonstrando um aumento da felicidade. A partir de 2007, temos um crescimento acentuado destes índices, o que representa uma queda brusca na felicidade dos adolescentes.


Gráfico 01: Maior Tendência a Se Sentir Sozinho. Porcentagem de adolescentes que concordam com a frase "Frequentemente, eu me sinto sozinho", ou "Muitas vezes, eu me sinto sozinho". Os valores de ambas as frases tendem a diminuir de 1991 até 2007, quando passam a crescer acentuadamente até 2015. O gráfico aponta o lançamento do iPhone em 2007 como um marco temporal.

Essa marca coincide com o grande aumento das horas que os jovens passam na frente das telas e a maior proliferação de smartphones. No ano de 2012, mais da metade da população dos EUA e aproximadamente 37% dos adolescentes já possuía um. Em 2016, esses números subiram para 77% e 73% respectivamente.


Essa participação nas mídias digitais, que leva a menores quantidades de relacionamentos interpessoais e de sono, é, de longe, a maior mudança na vida dos adolescentes nesse período. Segundo os pesquisadores, esta é a explicação mais plausível da queda abrupta do bem-estar psicológicos dos adolescentes.


Também podemos perceber que entre 1991 e 2016 os adolescentes que passavam mais tempo em contato com a comunicação eletrônica e com as telas reportavam índices menores de felicidade, de satisfação com a própria vida e de autoestima. O bem-estar psicológico dos jovens foi menor em períodos em que eles, como um grupo, gastavam mais tempo online do que quando se relacionavam pessoalmente entre si, liam mídias impressas e praticavam esportes. Assistir à televisão, atividade cuja popularidade diminuiu ao longo desse período, também esteve correlacionada à diminuição do bem-estar psicológico.


Gráfico 02: O que faz os adolescentes felizes? Para os adolescentes dos EUA, o grau de correlação entre felicidade e tempo gasto em atividades foi positivo para atividades fora das telas e negativo para atividades envolvendo telas. Em ordem de maior para menor valor, tem-se que possuem valores positivos "Esportes e exercícios", "Interação interpessoal", "Ritos religiosos", "Mídia impressa", "Lição de casa"; valor neutro, "Trabalho"; e valores negativos, "Ler matérias online", "TV", "Conversa por vídeo", "Conversa por mensagem de texto", "Mídias sociais",  "Jogos de computador", "Internet".

Mais especificamente, percebeu-se que conforme o tempo gasto com aparelhos eletrônicos, maior a autodeclaração de infelicidade dos jovens. Esses resultados vão ao encontro de outros estudos que ligam o uso de aparelhos eletrônicos com depressão e ansiedade em adolescentes.


Grupo de cinco mulheres utilizando o celular.

Em contrapartida, o estudo mostrou que adolescentes que passam mais horas em atividades “fora das telas” possuem índices mais altos de bem-estar psicológico e felicidade. Embora esse padrão tenha sido verificado para o grupo como um todo, ele foi mais forte para o 8º ano e 1º ano do Ensino Médio, para os quais toda atividade que não envolvia telas estava correlacionada com um maior índice de felicidade e toda atividade com telas, com menor felicidade.


Apesar destes achados, os pesquisadores concluíram que existe sim um equilíbrio de uso dos smartphones que faz bem ao jovem: eles observaram que os adolescentes que tinham abstinência total das telas não eram os mais felizes. Aqueles cujos índices de felicidade eram maiores eram os que utilizavam as mídias digitais por pouco menos de uma hora por dia (entre uma e cinco horas na semana). A partir desse limite, conforme as horas gastas na frente das telas aumentava, a infelicidade aumentava de forma consistente. Os adolescentes mais infelizes eram aqueles que utilizavam as telas por vinte horas ou mais na semana.


Grupo de quatro jovens se relacionando em frente ao computador.

A infelicidade desses jovens que possuíam total abstinência das telas pode ter diversas causas, entre as quais está a menor exposição ao ambiente social dos adolescentes. Considerando que a maioria deles utiliza bastante as mídias sociais e mensagens de texto, aqueles que ficam de fora desses meios perdem espaço no relacionamento com os colegas e isso pode refletir em seu bem-estar e autoestima.


Outra possibilidade é que estes jovens sejam pontos atípicos, de forma a não conseguir utilizar as redes sociais por terem necessidades especiais, ou não poderem utilizá-las por proibição parental.


Os adolescentes mais felizes são aqueles que têm uma interação social face-a-face maior que a média dos jovens e o uso de mídias sociais menor. A partir destes achados, pode-se recomendar que as pessoas tentem usar as mídias digitais de maneira mais limitada e aumentar a quantidade de tempo passada pessoalmente com amigos e fazendo exercícios físicos. Entretanto, aos pais, antes de colocar um controle rígido no tempo que seus filhos gastam online, converse com eles. Os psicólogos recomendam que é preciso ver caso a caso para decidir o limite diário que é benéfico ao jovem.


Mulher olhando o celular com uma cara entediada.

Além dos índices de felicidade, é interessante notar que outros hábitos referentes ao relacionamento interpessoal mudaram bastante entre os jovens nos últimos anos. É provável que essas mudanças estejam relacionadas à inserção e disseminação da tecnologia nas nossas vidas.


Por fim, essa nova geração é aquela que menos sai apenas com os amigos, isto é, sem a presença dos pais. É, também, a que menos sai em encontros como casal. Por consequência, esta é a geração que tem menos relações sexuais enquanto adolescentes, o que leva esta a ser também a que menos apresenta gravidez na adolescência e menor índice de DSTs. Analisando esses gráficos, poderia se dizer que esta é a geração que possui a menor pressa para crescer.


Gráficos 03 a 06. Geração Smartphone: Um Retrato Estatístico. Gráficos que demonstram a alteração de comportamento dos jovens atuais em relação ao maior uso de smartphones. Gráfico 03: Não estão saindo com os amigos. Há uma queda brusca do início dos anos 200 até 2015 na quantidade de jovens que sai sem a presença dos pais. Gráfico 04: Menos encontros... A porcentagem de adolescentes que saem em encontros também apresenta uma queda acentuada a partir dos anos 2000. Gráfico 05: ... E menos sexo. A porcentagem de adolescentes que já tiveram alguma relação sexual diminui a partir de 2012. Gráfico 06: Menor tendência a dormir o suficiente. A porcentagem de adolescentes que dormem menos do que sete horas na maioria das noites aumenta acentuadamente a partir de 2012.

E você, que esta lendo este post no seu smartphone ou na tela do computador,

sente que estar sempre conectado afeta a sua felicidade e seu bem-estar?

Para ler a Parte 1 de nosso post, acesse: Geração Smartphone? (1 de 2)


Para ler o artigo científico original, acesse:


*O estudo “Monitoring the Future” acontece desde 1975, mas coletava dados apenas de alunos do último ano da escola até 1991, quando começou a entrevistar também os dois grupos mais novos.


**Todos os gráficos demonstrados aqui foram retirados das respectivas fontes e traduzidos livremente.


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